As locações “Short Stay” em Condomínios e o que diz a Lei
O conceito de locação por curta temporada, mais conhecido como "short stay", segue sendo um tema polêmico dentro de condomínios residenciais.
Em cidades como Barcelona, a proliferação desse modelo de hospedagem levou o governo local a remover cerca de 66 mil anúncios de plataformas digitais, como o Airbnb, devido aos impactos negativos na oferta de moradia.
No Brasil, a questão ganhou relevância em 2024 com os julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O tribunal tem debatido se é possível realizar locações de curta duração em condomínios exclusivamente residenciais, utilizando plataformas como o Airbnb.
A seguir, detalhamos as principais decisões do STJ até agora e também as recomendações para síndicos e condôminos que buscam regulamentar esse tipo de locação no seu condomínio.

Por Rodrigo Karpat - Especialista em Direito Imobiliário e Condominial.
Os “condomínios de Airbnb”
Nos últimos anos, uma nova tendência tem movimentado o mercado imobiliário brasileiro: os "condomínios de Airbnb".
Esses empreendimentos estão sendo cada vez mais procurados por investidores e proprietários que desejam tirar proveito do boom do aluguel por curta temporada, ou como é popularmente conhecido, o short stay.
A expressão "condomínio de Airbnb" se refere a prédios ou conjuntos residenciais onde a maioria, ou até mesmo a totalidade dos apartamentos, são voltados para locações de curta duração por meio de plataformas digitais, como Airbnb, Booking, Vrbo, entre outras.
O crescimento das plataformas de aluguel por curta temporada, como o Airbnb, foi impulsionado pelo aumento do turismo e pela facilidade proporcionada pela tecnologia.
No Brasil, com grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis e Salvador sendo destinos turísticos de peso, a procura por hospedagem alternativa tem crescido significativamente.
O que diz o STJ sobre locações "short stay"?
O tema das locações short stay (ou locação de curta permanência) gerou diversos julgados no STJ em 2024, refletindo a complexidade dessa prática dentro de condomínios residenciais.
A primeira decisão relevante aconteceu em abril de 2024, quando a 3ª Turma do STJ analisou o recurso especial REsp 2.121.055/MG (Rel. Min. Nancy Andrighi).
O julgamento reafirmou que a locação via plataformas digitais deve ser tratada como um contrato atípico de hospedagem, o que a diferencia da locação por temporada prevista na Lei 8.245/91.
Além disso, foi destacado que, em condomínios de uso exclusivamente residencial, a convenção condominial pode vedar expressamente esse tipo de locação, com base nos riscos à segurança e na rotatividade de pessoas.
Essa decisão gerou grande debate, já que o julgamento foi suspenso por pedido de vista, ou seja, ainda não há uma definição final.
Essa mesma 3ª Turma, em outro caso relacionado, o REsp 1.954.824/MG, votou contra a locação atípica inicialmente, mas reviu a posição para permitir que a locação fosse aceita, caso a convenção não a proíba expressamente.
No entanto, também nesse caso, o julgamento foi interrompido por pedido de vista.
Para tentar uniformizar o entendimento, a 3ª Turma sugeriu que o tema fosse levado à 2ª Seção do STJ, composta por ministros das Turmas de Direito Privado, o que poderia resultar em uma decisão vinculante para todos os tribunais do país.
Como regularizar as locações "Short Stay" no condomínio?
Dada a incerteza jurídica e as diferentes decisões que ainda estão sendo tomadas, é fundamental que os condomínios adotem medidas claras para regulamentar ou até proibir as locações "short stay".
Uma das formas mais eficazes de fazer isso é por meio de alterações na convenção condominial e no regimento interno, com a inclusão de cláusulas específicas que estabeleçam regras e restrições.
Por exemplo, a convenção pode incluir uma cláusula que proíba expressamente a locação para hospedagem atípica, como já se discutiu nas decisões judiciais.
No entanto, a convenção também pode permitir esse modelo de locação desde que atendidas algumas condições, como autorização prévia em assembleia e a observância de regras que protejam a convivência e segurança dos moradores.
Uma sugestão de cláusula para a proibição de locação atípica poderia ser a seguinte:
"Fica vedado o uso de unidades para hospedagem atípica ou curta temporada, inclusive por meio de plataformas digitais, salvo autorização expressa em assembleia e alteração da convenção com quórum mínimo de 2/3 dos condôminos."
Por outro lado, se o condomínio decidir permitir a locação short stay, a convenção pode estabelecer que a autorização para a locação seja regulamentada em assembleia, incluindo condições específicas para garantir que a segurança e a qualidade de vida dos moradores não sejam prejudicadas.
Aspectos importantes para considerar na regulamentação
Se a locação for autorizada, é importante definir algumas regras claras para preservar o caráter residencial do condomínio. As principais questões a serem tratadas incluem:
- Sossego e segurança: Definir que os hóspedes não podem perturbar o sossego dos moradores ou comprometer a segurança do condomínio.
- Número de hóspedes e duração das estadias: Estabelecer limites quanto ao número de hóspedes por unidade e prazos mínimos de estadia. Essas condições ajudam a evitar que a unidade seja utilizada como um hotel improvisado, preservando o ambiente residencial.
- Responsabilidade por danos: A convenção deve deixar claro que o condômino-locador será responsável por quaisquer danos ao patrimônio comum ou violação das normas internas. Para isso, é possível exigir que o locador assine um termo de responsabilidade, identificando os hóspedes e garantindo o cumprimento das normas do condomínio.
- Fiscalização e sanções: A regulamentação também deve prever a fiscalização do uso das unidades e as sanções para o descumprimento das regras. Multas e até a suspensão temporária do uso das áreas comuns podem ser estabelecidas para garantir o cumprimento das normas.
Boas Práticas para Assembleias Condominiais
Para que as decisões sobre a regulamentação de locações "short stay" sejam tomadas de forma eficiente e sem gerar conflitos, é fundamental seguir algumas boas práticas:
- Estudo de impacto: Antes de discutir o tema, recomenda-se a elaboração de um estudo de impacto sobre a prática de locação de curta duração. Esse estudo deve abordar questões como rotatividade de hóspedes, segurança, encargos administrativos e tributários, e também fornecer exemplos de outros condomínios que já regulamentaram essa prática.
- Consultoria especializada: É altamente recomendável convidar advogados especializados em direito condominial para orientações jurídicas sobre os riscos legais. Um síndico profissional também pode ser consultado para ilustrar os benefícios e desafios dessa prática, com base em experiências anteriores.
- Decisão clara: Ao final da assembleia, é essencial que seja votada uma norma clara e objetiva que defina os limites de prazo (ex: até 30 dias de estadia), o número de unidades permitidas para operar nesse modelo e a responsabilização civil dos locadores por danos ao patrimônio comum.
Conclusão: Garantindo Segurança Jurídica
Enquanto o STJ não define uma posição vinculante e a legislação não é reformada, a melhor forma de garantir segurança jurídica ao condomínio é através da revisão da convenção condominial, com a inclusão de regras claras sobre o uso de plataformas digitais para locação.
Isso não só ajuda a evitar problemas jurídicos, mas também contribui para uma convivência mais harmoniosa entre os condôminos.
Adotar uma regulamentação bem estruturada traz previsibilidade às decisões condominiais, reduzindo a margem para conflitos e fortalecendo a segurança jurídica, especialmente em um contexto de incertezas judiciais.
Leia também: O que diz a Lei do Inquilinato?

Conteúdo: Rodrigo Karpat, especialista em Direito Imobiliário e Condominial; presidente da Comissão Especial de Direito Condominial no Conselho Federal da OAB e da Comissão de Direito Condominial da OAB/SP.
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